Se tem coisa que me incomoda é esperar. Não tem nada mais desagradável do que me apressar para estar a postos e ter que aguardar algum atrasadinho.
Acredito que muitos comungam da minha inquietação face a tanto descaso com o tempo alheio. A “cultura” brasileira do atraso é tão desagradável que estimulou o psicólogo americano Robert Levine a publicar, nos anos 90, o livro “A Geografia do Tempo” – a partir de uma pesquisa realizada em 31 países. Nesta obra podemos localizar o Brasil logo no topo do ranking da impontualidade, ficando atrás apenas da Indonésia e do México.
Lamentavelmente, o jeitinho brasileiro ainda não conseguiu apagar esse terrível estigma que carregamos: o de sermos culturalmente impontuais.
Oras, eu penso que a origem do problema da impontualidade está atrelada aos mesmos motivos pelos quais as pessoas furam fila, estacionam em fila dupla ou avançam o sinal vermelho. É muito fácil justificar essas gafes, embora tenha ainda os que simplesmente não as justificam.
Segundo Levine, “A espera é o sintoma de inferioridade social. Fazer-se esperar é sua prerrogativa da importância. O “Chá de cadeira” é a fila do notável. Chegar atrasado é o apanágio do poderoso, aquele cuja presença é estrutural para qualquer começo”
Não é esta uma afirmativa infundada, já que se pode associar o descompromisso do brasileiro a um passado longínquo. Em 1808, quando a corte portuguesa desembarcou no Brasil, trouxe juntamente com sua posição superior na hierarquia político-social da colônia, uma certa bagagem de soberba, a partir da qual faziam-se esperar por horas – mesmo não havendo qualquer outro compromisso.
Tal ato se dava por mera afirmação de poder, fato este, que trazido aos moldes dos dias atuais, segue uma lógica idêntica à da época imperial: organização verticalizada da nossa sociedade.
O antropólogo Roberto DaMatta ousa ainda afirmar: “Quanto mais poderosa a pessoa, mais esperamos por ela.” A agenda abarrotada costuma ser o argumento mais utilizado por profissionais das mais diversas áreas, e convenhamos, haja paciência. Aliás, suponho que seja daí que se origina o termo “paciente”. Alguém já se perguntou o porquê de consultas médicas raramente se procederem no horário?
Outro dia fui a um oftalmologista e marquei o primeiro horário da agenda do “doutor” por conta de que eu também teria compromissos profissionais mais tarde. Cheguei ao consultório com meia hora de antecedência, já que eu ainda não era “paciente” e precisava realizar meu cadastro. No horário exato marcado para a consulta, avistei-o saindo do elevador e pensei:
-Poxa! Bacana. Não precisarei atrasar porque a consulta será na hora.
Pensei cedo demais, o indivíduo sentou-se junto à secretária, serviu-se de café e ficou “batendo um papinho”, colocando-se a par das mais variadas novidades e fofocas, o que obviamente me obrigou a levantar-me, servir-me de um café, me por sentada frontalmente e de forma indiscreta passar a ouvir a conversa deles, para que percebessem que eu estava ali, aguardando a boa vontade do “doutor” me prestar o atendimento – que não custava barato, por sinal. Suponho que o constrangimento causado pela minha atitude tenha o feito levantar-se e me chamar para o atendimento. Ou seja, além de se atrasar para seu compromisso profissional para comigo, me fez sair às pressas tentando não me atrasar para o meu.
E o que dizer ainda de amigos, namorados (maridos, “peguetes” e afins) que atrasam? Quem nunca foi “vítima” de relacionamentos que envolviam atrasadinhos corriqueiros que atire a primeira pedra – ou então que seja apedrejado se já “vitimou” alguém.
Se você costuma se atrasar, pelo bem dos relacionamentos e preservação do humor de seu companheiro/amigo, mude! Se trata de conscientizar-se de que dispor do tempo do outro, além de ser uma falta grave de civilidade, é muito mais cruel do que se percebe.
A ideia de que tempo é dinheiro nos EUA, por exemplo, tem um alto valor cultural. Então, já que nos “americanizamos” em tantos termos, costumes e “junk foods”, por que não importamos a ideia de sermos pontuais?
Por favor, seja pontual! A pontualidade é uma forma de expressar a importância que cada compromisso tem para você, assim como o respeito que você tem pelas pessoas que estão envolvidas. Ser pontual além de demonstrar o respeito pelo que foi combinado, inspira confiança e credibilidade. Demonstra sua capacidade de gerenciar a si e ao próprio tempo.
Meu pai sempre foi extremamente crítico com horários (ainda é) e sempre me ensinou a ser pontual. Lembro de ir ao clube com meu irmão sob a condição de voltar determinado horário. Claro que não se podia perder nem um minuto da brincadeira e saímos às pressas na maioria das vezes. O fato engraçado é que quando nos adiantávamos, nunca tocávamos a campainha antes, ficávamos na esquina aguardando chegar o horário estabelecido (para não dar o gostinho de chegar antes hahahaha).
Essa velha história de infância além de compartilhar um pouco sobre a forma que aprendi a ser pontual – e crítica sobre isso, serve para demonstrar que tudo vira exemplo e reflete ativamente sobre como as pessoas agirão conosco.
O atraso, além de falta de respeito pelo tempo do outro é também um atraso de vida alheia. Se o trem não espera por ninguém, por que é que os outros tem que esperar por você?
Planeje, preveja possíveis intempéries, seja pontual e pontue nos seus relacionamentos. Os relacionamentos e a sociedade agradecem.
Beijinhos 😉
Segue lá @jannacamposp
Sugestão de leitura:
http://vejario.abril.com.br/materia/gente/atrasados
http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/caderno-3/coluna/roberto-damatta-1.140/mata-ria-248899-1.486037
*texto originalmente postado em 31/03/2016.
2 comentários
Parabéns amiga, estou adorando as matérias! Sucesso
Perfeito Jana!!! Sempre defendi a pontualidade, apesar de muitos me chamarem de “chata” por causa disso.