Não tem pra onde fugir. O gin é sim o destilado do momento, e vai figurar nos queridinhos da coquetelaria durante bastante tempo. Mas além de me perguntarem muito qual o melhor gin do mundo e o que fazer com gin, a pergunta que eu mais ouço é: “De onde vêm tanto sucesso?”
E eu gostaria de ter uma resposta simples pra dar. Infelizmente sabemos que respostas simples são mentirosas, preguiçosas ou incompletas. Vamos a alguns fatos, e como eles podem ter contribuído para essa onda.
1- Tudo é cíclico. O gin não foi sempre encarado como bebida marginal e nem de fim de carreira, como muitos old school costumam narrar. Eles falam “beber gin, há 20 anos atrás era o auge da dependência”, mas se esquecem que a história do gin data de meados de 1572, na Holanda, e pode ser vastamente encontrado na história da coquetelaria, em diversos clássicos como o Dry Martini, Ramos Gin Fizz, Tom Collins e o super popular Gin & Tônica.
2- Antigamente a forma clássica de servir um Gin & Tônica era num copo alto, com muito gelo e uma rodelinha de limão. Esse modo de serviço pode até funcionar para gins no estilo Old Tom (que não são tão secos quanto o London Dry), já que deixam pouco espaço para colocar a água tônica. Mas como o London Dry é o estilo que ficou mais famoso no mundo, este tipo de serviço tornou-se pouco adequado, e não valorizava aroma e sabores, levando a um cocktail desequilibrado.
3- Poucas opções de marcas de gin existiam no nosso mercado, e pouco incentivo de bares e marcas ao consumo da bebida. Porém, com diversas crises de logística na produção de whiskies, a indústria teve que repensar seus portfólios.
Entenda, para um whisky/whiskey ficar pronto, para além do tempo de fermentação e destilação do álcool, ainda existe o tempo de maturação em barris de carvalho, que flutua por volta dos três anos NO MÍNIMO de estágio. Sabemos que os 12 anos são mais apreciados e que encontra-se de 18 anos até 21 e 30 anos com certa facilidade. Um gin não demora 24h pra ficar pronto. Percebe a velocidade de retorno de investimento e lucro? É bem plausível enxergar que essa estratégia permitiu inclusive que destilarias de whisky/whiskye sobrevivessem. Então aquela forcinha da indústria, com incentivos de marketing ajudaram bastante, assim como novas possibilidades de marcas de qualidade e não somente aquela garrafa de tampa plástica, triste na prateleira, que davam uma ressaca mais conhecida como ˜Jesus me chama!”
4- Ritual. A coquetelaria avançou bastante e a nível até de permitir que alguns charlatanismos acontecessem. Mas o fato é que a nova maneira de servir Gin & Tônica também favoreceu o reequilíbrio da bebida e seu mixer, e ainda trouxe harmonizações de especiarias e frutas para compor sabores e aromas bem mais agradáveis. Surgiram novas águas tônicas de quinino e novas taças que, com sabedoria e parcimônia, deram ressignificado ao icônico cocktail surgido de senhores ingleses que tomavam seu gin com quinino dissolvido em água para tratar a Malária.
5- Não é coquetelaria sem uma boa polêmica. Boa parte da popularização da bebida passa pelo informação de que o gin é a bebida menos calórica que existe. E muitos ainda afirmaram suas propriedades de aceleração do metabolismo e de emagrecimento.
Além disso, tendo um tipo de serviço mais “clean” – sem aquele monte de fruta e açúcar das caipis de vodka – a bebida acaba dando a sensação de menos calórica (apesar da água tônica ser um refrigerante). Como eu não sou nutricionista, e a cada dia que passa novos estudos surgem sobre o assunto, a única afirmação que parece unânime é: por ser feito de zimbro e redestilado com diversos botânicos, o gin mantém algumas das características medicinais desde sua invenção como um elixir estimulante, diurético e contra lombalgias do Dr. Sylvius – reconhecido por muitos como inventor do gin.
Mas ainda fica a dúvida, depois de toda essa história: o que é, como é feito e de que é feito o gin?
Sempre achei importante entender os principais ingredientes das bebidas, pois é delas que vêm as referências de sabor que precisamos capturar para entender o que nosso paladar vai receber. Saber que o rum é feito de melaço de cana nos leva a esperar por sabores que não vamos ver em uma cachaça branca, que é feita de caldo de cana.
O gin é uma bebida retificada, ou seja, redestilada de um álcool neutro de cereais com diversos botânicos que dão aroma e sabor à bebida, inclusive, e especialmente, o ZIMBRO, um pseudo fruto de árvores coníferas que modificou sua estrutura de pinha para se adaptar ao longo do tempo até essa estrutura de baga carnosa que vemos hoje. Inclusive, é das letras iniciais dessa palavra que se origina o nome da bebida:
Jenever (Holandês) – Ginepro (Italiano) – Juniper (Inglês) – Zimbro (Português)
E esses botânicos que tanto se fala em gin? Fácil. São as especiarias que dão sabor, aroma e complexidade às receitas de gin. São, todas elas, pedaços de alguma planta, por isso universalmente chamadas de botânicos. Exemplos mais populares e fáceis de conhecermos são: semente de coentro, cravo-da-índia, anis estrelado, cascas de cítricos, amêndoas, raízes e sementes de lírio, angélica, menta, cardamomo, chás, louro, manjericão, alecrim, algumas flores (rosas, flor de laranjeira, lavanda…), canela em casca, açafrão, camomila e por aí vai.
Por isso que estes ingredientes, quando colocados na taça junto ao gin, intensificam o sabor e aroma das bebidas. Quando são servidos com tônicas, os gins se diluem, e é imprescindível que a guarnição do cocktail esteja alí pra conectar os sabores da bebida com a sua experiência.
Sabendo disso, percebemos que não é qualquer especiaria ou botânico que casa perfeitamente com qualquer gin utilizado para fazer o seu cocktail. É bastante claro que, dependendo do gin utilizado, as características que você deseja ressaltar são diferentes, e, portanto, os ingredientes deste gin com tônica devem ser melhor escolhidos de acordo com os botânicos da fórmula do gin escolhido no momento.
As principais marcas não escondem os ingredientes que utilizam em suas fórmulas. Os segredos estão nas quantidades utilizadas, no equilíbrio entre botânicos, nos fornecedores e na qualidade de cada ingrediente, no álcool utilizado e em algumas técnicas que diferem de um processo para outro de produção, que são contados bem por alto em suas palestras e treinamentos. Claro, cada marca quer mostrar suas vantagens e diferenciais na produção, para que valha a pena o preço e preferência na hora de escolher seu gim.
Em tempo, eu não errei a grafia da palavra na última frase não. Na nossa língua-pátria ela pode ser escrita com M ou N no final. É mais comum encontrar com N, pois é a maneira que se escreve em inglês.
Para nos despedirmos em tom de brinde, um bônus maravilhoso que a onda do gin trouxe para nosso país foi a maior aceitação da água tônica como bom mixer para cocktails, e abriu um leque de possibilidades de bebidas refrescantes e elegantes com o toque do amargor necessário. Isso introduz uma nova possibilidade para os bartenders, e abre alas a um sabor outrora pouco explorado no nosso país. Claro, amargo era sinônimo de estragado e ruim. Mas existe todo um paladar interessante no amargo e aos poucos vamos aceitando melhor esse sabor incompreendido, tanto na coquetelaria quanto nas cervejas bastante lupuladas.
Água Tônica Fever Tree Mediterrânea
Com o tempo vão surgindo mais marcas de águas tônicas e podemos escolher e testar como o resultado do cocktail difere quando se utiliza uma água tônica diferente. Marcas como Fever Tree, London Essence e até brasileiras como 202 e Riverside vão ganhando espaço com a lógica de “se ¾ do seu cocktail são de tônica, você tem que usar uma boa água tônica”.
Agora que você está expert em gin, é hora de botar a mão na massa. Escolha uma marca que tenha ingredientes interessantes, procure informações sobre os seus botânicos, harmonize em seus gin tônicas, ressaltando suas notas e tire aquela onda com quem ainda não se inteirou desses detalhes profissionais. Cheers!