FAÇA DRINKS, NÃO FAÇA GUERRA!

Lembra daquela regra de adultos que diz que não pode misturar bebidas para ter uma festa com final feliz e um dia seguinte iluminado? Pois é. Ela não se aplica à coquetelaria.

Aliás, muitos cocktails foram elaborados pensando em como dar aquela melhorada no poder de diversão – leia-se poder alcoólico – da bebida. Algo que os americanos chamam de “dar um punch“. Uma certa pujança, digamos assim.

Foto do cardápio do Arnaud’s French 75 Bar

Essa técnica de aumentar grauzinhos alcoólicos na bebida final, e consequentemente o seu sabor, foi o responsável por criações famosas como o Negroni, que substitui a água com gás do Americano pelo gin. Mas hoje nossa história não é a do Negroni. É do French 75, também conhecido na França apenas por Soixante Quinze (75).

Um cocktail tão famoso e icônico que Nova Orleans, a cidade berço de diversos clássicos como Ramos Gin Fizz e o Sazerac, possui um bar com seu nome, de onde saem taças e mais taças da versão local do French 75, feita com Courvoisier V.S. e Moët & Chandon.

Receita do cardápio do Arnaud’s French 75 Bar

Seu nome faz alusão a uma arma francesa muito potente, usada durante a primeira guerra mundial: o canhão de 75mm. Uns dizem que o nome do cocktail vêm de sua potência, que mistura gin, limão, açúcar e champagne, e que por isso tem a força de um canhão. Outros dizem que foi criado por soldados ingleses que, lutando em território francês, possuíam apenas gin, limão açúcar e champagne, e os misturavam em projéteis usados do canhão de 75mm. Apesar de completamente improvável, eu gosto dessa versão. É bem folclórica.

Pode ser adquirido no astimegoesbymilitaria.com.au

Um bocado menos folclórico é uma de suas primeiras aparições mais importantes em um livro de 1921, escrito por Harry McElhone, com uma receita bastante diferente da que temos hoje. Porém em 1927, o Here’s How!, de Judge Jr., nos traz o mais próximo do que seria uma versão definitiva que sobreviveria até os dias atuais, com o agravante de que nem todos leriam as instruções de como fazer. Dois anos depois o aclamado The Savoy Cocktail Book repete a receita e o modo de preparo. Só pra confirmar.

Pois é, em quase qualquer curso de coquetelaria que você fizer, ou balcão que você sentar e pedir um F75, você vai ser servido com um cocktail em uma taça flute, aquela esguia e comprida taça de champagne. Mas não é porque o cocktail possui champagne que tem que ser servido na taça de champagne. Inclusive, nos dois livros citados em que aparecem as receitas do F75, aparecem também o famoso Gin Fizz (e o John Collins e o Tom Collins que se confundem em vários momentos, mas possuem estrutura parecida), que é um sour* de gin com adição de água com gás para diluir e abrir aromas, mantendo acidez, textura e refrescância.

Como bem retomou o mixologista Jeffrey Morgenthaler há uns cinco anos em seu vlog, não é necessário muito esforço pra perceber que o F75 é uma variação de um destes cocktails citados acima, porém com borbulhas no vinho invés de borbulhas na água e, portanto, deveria ser servido também em copo alto com gelo, como especifica o modo de preparo citado no The Savoy Cocktail Book. Aliás o Here’s How! faz questão de pontuar essa arquitetura, deixando claro que substituindo o champagne por club soda, você tem um Tom Collins.

Minha sugestão é que façam os dois modos e decidam qual versão vocês preferem. Possivelmente algum desavisado vai dizer que o original clássico é feito na taça flute. Mas aí você passa esse link pra ele ler. ;-]

Outra dica que eu deixo é válida para vários sours. Na coquetelaria é comum substituir o açúcar por xarope. Em outro post eu posso discorrer melhor sobre agentes adoçantes, mas fato é que isso possibilita várias vantagens na hora de reproduzir um cocktail. E também nos dá a possibilidade de trabalhar outros sabores. Abaixo segue o link de um vídeo do Clube do Barman da época em que colaborei para a plataforma. No vídeo eu ensino a fazer um “Flower 75”, nome que batizou essa releitura que troca o xarope de açúcar por xarope de hibisco**, trazendo sua coloração avermelhada e notas florais ao cocktail.

Aproveitando a menção ao perfil de sabor, ao escolher o gin, opte por marcas que utilizem a destilação de botânicos frescos invés de adição de aromas ou concentrados. A maioria traz estas informações no contra rótulo e marcas famosas costumam ter sua qualidade garantida.

Quanto à parte do Champagne, é bastante difundido hoje em dia que para ser denominado Champagne o vinho espumante deve ser produzido na região francesa de mesmo nome, seguindo rigorosas regras de AOC, ou seja Appellation D’origine Contrôlée (equivalente ao DOC – Denominação de Origem Controlada). Para esta receita, o válido é que seja um vinho espumante de qualidade, feito no método tradicional ou em tanque (método charmat), com boa acidez e baixa quantidade de açúcar adicionado como licor de expedição ou residual.

Claro, se o seu paladar tende para prazeres mais adocicados, abuse dos demi-sec. Já o doce, neste caso, acaba por roubar o sabor dos demais ingredientes. Se for utilizar um espumante doce, talvez seja uma boa ideia excluir o xarope de açúcar da receita.

Amou a receita? Faz na Jarra e sirva para seus convidados no bom estilo Clericot. Só não deixe de fazer. Essa receita é um TIRO! Santé!

# French 75

  • 45ml de Gin London Dry
  • 25ml de Sumo de Limão
  • 25ml de Xarope de Açúcar 1:1
  • Completar com Espumante Brut

MODO DE PREPARO:

Bater em uma coqueteleira com gelo em cubos e coar para um copo alto com gelo e complete com espumante (aproximadamente 70ml).

Guarnecer com casca de limão siciliano borrifada (flambada ou não)

# Flower 75

  • 50ml de London Dry Gin
  • 20ml de Sumo de Limão
  • 25ml de Xarope de Hibisco**
  • Completa de Espumante Brut (Aproximadamente 60ml)

MODO DE PREPARO:

Bater os ingredientes, exceto o espumante, em uma coqueteleira com gelo em cubos. Coar para uma taça flute gelada ou um copo alto tipo collins com gelo. Completar com o espumante, mexer levemente para integrar os ingredientes. Guarnecer com Zest de Limão Siciliano (flambado ou borrifado), uma cereja amarena e uma flor (de preferência de hibisco).

*SOUR:

Cocktail que possui em sua base de ingredientes uma bebida principal (geralmente destilado), um agente acidulante (normalmente um cítrico como o limão) e um agente adoçante (geralmente açúcar).

**XAROPE DE HIBISCO:

1- Ferver 500ml de Água filtrada com aproximadamente 30g de hibisco seco.
2- Desligar o fogo e deixar descansando tampado até esfriar.
3- Coar o hibisco e dispensar a parte sólida. Ao líquido acrescentar 500g de açúcar cristal ou refinado. Mexer até dissolver completamente. Pode esquentar levemente no fogo para ajudar na diluição. Não deixar reduzir.

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