A ALERGIA ALIMENTAR DIAGNOSTICADA EM TENRA IDADE DEVE SER TRATADA COM DIETA DE EXCLUSÃO RÍGIDA ISENTA DO ALIMENTO ALERGIZANTE E, COM ISTO, ATÉ A IDADE ESCOLAR A CURA SERÁ ATINGIDA!
SERÁ???????
Até há poucos anos essa frase era o que nós, Alergistas, falávamos aos pais de crianças alérgicas no momento de seu diagnóstico e em cada reconsulta. Pois é, as coisas têm mudado. Estudos nos mostram que essa tão almejada cura pode NÃO vir espontaneamente num percentual muito maior de crianças do que presumíamos e isso se tornou alarmante quando uma publicação nacional de um centro importante de pesquisas em alergia alimentar constatou que cerca de 50% das crianças alérgicas IgE mediadas a leite e ovos seguidos por eles, não tinham atingido a tolerância oral até os 5 anos de vida. Na prática clínica também temos observado esse perfil de pacientes graves e que não melhoram espontaneamente com o tempo, aliás, pioram apesar da dieta e dos cuidados. Quando uso o termo “atingir a tolerância oral”, leia-se “atingir a cura”, significa que o organismo do paciente está agora tolerante àquela proteína alergizante que outrora lhe gerava tantos sintomas.
De longe a alergia ao leite (APLV) e aos ovos são as mais prevalentes em todo o mundo. Fato este tem sua imensa importância quando pensamos que estes são ingredientes de muitos alimentos seja caseiros ou industrializados e que podem ser encontrados em qualquer lugar e não somente em alimentos, mas também em cosmetologia e até em medicamentos. Portanto o risco de uma criança com alergia IgE mediada ( aquela que pode gerar reações anafiláticas) ter um contato inesperado e acidental com tais alérgenos, gerando quadros graves com risco de morte é iminente.
Vários estudos apontam para a existência de dois fenótipos clínicos distintos na alergia IgE mediada, associados a diferentes prognósticos: um mais ligeiro e um mais grave, no qual a alergia é persistente e os sintomas são extremamente graves (quadros de anafilaxia) mesmo em contato com irrisórias quantidades do alérgeno.
Era extremamente frustrante para o Alergista simplesmente não poder oferecer formas de tratamento para este fenótipo de pacientes. Nos últimos 15-20 anos, no mundo todo, colegas têm estudado exaustivamente formas de tratamento com o objetivo de INDUZIR A TOLERÂNCIA NESTE PERFIL DE PACIENTE ALÉRGICO GRAVE. Com isso surgem os protocolos de DESSENSIBILIZAÇÃO ORAL E OS PROTOCOLOS CHAMADOS COMUMENTE DE “BAKED” (antígenos alimentares processados).
Também conhecida como IMUNOTERAPIA ORAL, a DESSENSIBILIZAÇÃO é realizada com a ingestão do alimento alergênico causador, em quantidades gradativas, iniciando-se com diluições extremas que, a olho nu, parecem conter apenas água, e gradualmente essas diluições vão diminuindo até se atingir o alimento “in natura”. A partir deste momento as doses também são gradativas, sempre com extremo cuidado pois reações podem ocorrer e efetivamente ocorrem. Apesar da eficácia, o procedimento envolve riscos de reação anafilática.
Tal procedimento deve ser realizado por equipe de profissional e Alergista capacitado para aplicação deste protocolo tão peculiar e em ambiente médico com possibilidade de atender emergências. O real objetivo é induzir a tolerância ao alimento ao qual a pessoa é alérgica.
Os riscos durante a Dessensibilização são considerados “riscos presumidos” dentro de um ambiente médico com profissionais capacitados para atender qualquer tipo de intercorrência inclusive choques anafiláticos. Estes pacientes são tão graves que o maior risco se encontra em suas vidas quotidianas, na impossibilidade de se frequentar uma escola, de sair para comer fora, de ir à festinha de um amigo… Eles vivem uma situação de “risco iminente” diário.
A técnica não cura a alergia e para manter a tolerância ao alérgeno, o contato deve ser constate, e não se deve interromper a ingestão do alimento, pois as reações alérgicas podem voltar.
A mídia escrita e televisiva têm mostrado com frequência nos últimos anos, vários casos de pacientes dessensibilizados, sobretudo por termos em nosso país um importantíssimo Centro de Alergologia na USP (Universidade de São Paulo), pioneiro neste tipo de tratamento, com resultados excelentes e um trabalho de muita seriedade, comprometimento e capacidade.
Outra forma de tratamento, leia-se intervenção, bastante utilizada em casos de alergias persistentes IgE mediadas é a INDUÇÃO DE TOLERÂNCIA COM USO DE ALÉRGENOS PROCESSADOS, conhecidos como “BAKED”. Atualmente acredita-se que a aquisição de tolerância ao alérgeno processado possa ser o primeiro passo para o desaparecimento da alergia. Ao submeter o alimento a altas temperaturas, pode-se modificar a capacidade de ligação à IgE, portanto diminuir a sua alergenicidade – capacidade de gerar reações em indivíduo alérgico. Algumas proteínas são mais suscetíveis a esse tratamento térmico e a associação desse alérgeno a uma matriz (preparos com trigo, p exemplo), parece favorecer a digestibilidade da proteína ou até mesmo tornar os epítopos (partes mais alergizantes da molécula proteica) menos acessíveis.
Da mesma forma que existe um perfil de paciente para se indicar a Dessensibilização, aqui ocorre o mesmo. Este procedimento de inclusão dos alimentos “baked” deve ser realizado por profissionais alergistas e equipe capacitada em ambientes médicos. Não é porque o alérgeno está processado que não pode gerar reações alérgicas graves, inclusive anafilaxia. Os Testes de provocação oral com alimentos processados são seriados, liberando gradualmente os alimentos.
Muitos estudos continuam a ser feitos tanto em Dessensibilização (Imunoterapia oral) quanto na Indução de tolerância através de alérgenos processados (“baked”). Ainda temos muito a aprender. É de fundamental importância que o profissional Alergista que se propõe a executar tais procedimentos tenha a capacitação necessária. Hoje já temos vários especialistas no país executando tais tratamentos, com o mais alto padrão de qualidade e seriedade.
Como podem observar, não são todos os alérgicos que se enquadram no perfil daqueles que podem vir a se beneficiar deste tratamento e isso me deixa muito feliz, pois ainda hoje, a grande maioria atinge sua cura espontaneamente. A indicação de qualquer procedimento de indução de tolerância deve ser minuciosa, criteriosa, com muita seriedade e ciência.
Ademais, é tão bom dizer aos pais desses pacientes extremamente alérgicos com uma qualidade de vida precária, que parece existir sim uma luz no fim desse túnel.
Obrigada e até breve.