Não raro alguém se dizer alérgico a medicamentos, quer seja pois cresceu ouvindo isto dos pais ou mesmo foi suposto este diagnóstico na idade adulta sem nenhuma comprovação. Hipóteses devem ser confirmadas visto que ao afirmar que alguém é alérgico a este ou aquele fármaco implica não só a sua exclusão do arsenal medicamentoso deste indivíduo, bem como do cuidado e até mesmo da proibição do uso de outros medicamentos da mesma classe ( semelhantes a eles quimicamente falando).
Para começo de conversa se faz muita confusão entre “alergia” e “reação adversa”. Vou explicar melhor. Se eu uso um broncodilatador (medicamentos usados para aumentar o diâmetro dos brônquios em casos de “bronquite”) e tenho taquicardia (aumento dos batimentos do coração) e tremores após seu uso é uma “reação adversa” pois se trata de uma reação provável de acontecer devido aos mecanismos fisiopatológicos desta medicação. Portanto não se trata de “reação alérgica” e muitas pessoas terão tal sintoma. Já se eu uso, por exemplo, uma Dipirona e logo após começo a ter lesões avermelhadas que coçam muito pelo meu corpo, isso sim caracteriza uma reação de “provável” fundo imuno-alérgico. De uma forma simplista é mais os menos isto.
Fato é que alergia medicamentosa existe sim e pode manifestar-se de formas mais discretas ou mesmo de formas gravíssimas e potencialmente fatais. No Brasil, estima-se que cerca de 0,5% a 1% das pessoas tenham alguma alergia medicamentosa e os maiores vilões são os analgésicos e anti-inflamatórios sem deixar de lembrar dos antibióticos e dos famigerados anticonvulsivantes. Incrível saber que esta falta de diagnóstico confirmado seja um problema mundial. Nos EUA, por exemplo, entre 8 a 10% da população se diz alérgica a Penicilina e quando isto é verificado corretamente, nem 10% destas pessoas apresenta alergia real a este antibiótico.
Faz-se necessária uma correta avaliação médica que consiste desde uma história clínica detalhada com correlação direta entre exposição ao medicamento e aparecimentos dos sintomas para se dar início a uma avaliação mais profunda. Serão realizados exames caso se façam necessários que virão a corroborar com o diagnóstico de certeza. Desde exames de sangue, testes cutâneos e até mesmo Testes de provocação, de acordo com a necessidade. Tudo isso vem embasado na literatura médica e conhecimento profundo sobre os mecanismos fisiopatológicos de cada fármaco.
Importantíssimo ressaltar que NÃO se faz qualquer investigação, exame ou teste para diagnosticar possíveis alergias futuras a medicações caso o paciente nunca tenha apresentado reações suspeitas. Não se prevê reação medicamentosa! Se investiga caso tenha ocorrido algo suspeito pois os testes isoladamente não fazem diagnóstico e corre-se o risco de falsas conclusões.
Diagnóstico concluído e a partir de agora esta pessoa deve portar consigo documento identificando sua alergia medicamentosa para que em caso de necessidade de prescrição médica apresente ao médico tal informação e se opte por outras alternativas. Sabemos que alguns medicamentos podem apresentar reações cruzadas com outros seus semelhantes e isto o Alergista já deve informar o paciente no momento da conclusão diagnóstica. Planos emergenciais por escrito devem conter as orientações caso o paciente seja equivocadamente exposto a algum medicamento e apresente reação . Atualmente até a tecnologia têm ajudado pois existem aplicativos para celular que orientam a possibilidade de uso deste ou daquele medicamento caso você seja alérgico. Obviamente não substituem a orientação de seu médico mas este é mais um exemplo de como a tecnologia pode nos favorecer.
Mas Dra. , a alergia a remédio é ”pra sempre” ou cura com o tempo?
Pergunta fatal após um diagnóstico. Esse tipo de alergia tende a não ter cura espontânea, salvo algumas exceções em que as reações ocorreram ainda na infância. A grosso modo adulto tem muito mais alergia a medicamento do que as crianças. É o contrário de alergia alimentar em que as crianças têm muito mais do que os adultos. Para agravar a situação, as crianças apresentam quadros virais e bacterianos que se manifestam por lesões exantemáticas ou mesmo urticárias – formas de lesões de pele- e quase sempre fizeram uso de anti térmicos, analgésicos ou antibiótico e isto pode confundir na identificação do fator causal destas lesões levando a falsas hipóteses de que foi o medicamento o culpado pela reação quando de fato não foi. Importantíssimo antes de rotular qualquer pessoa como sendo um “ alérgico a medicamento”, ter uma correta investigação.
E vamos supor que eu tenha reação a uma medicação da qual eu tenha uma real e imprescindível necessidade de fazer uso para curar algo mais sério, com por exemplo é o caso das alergias aos Quimioterápicos (tratamento para vários tipos de tumor) ou mesmo aos medicamentos para Tuberculose e Sífilis?
Nestes casos pode-se proceder com a Dessensibilização. Este procedimento médico pode ser indicado para pacientes alérgicos a determinados medicamentos sem outra alternativa terapêutica ou quando a opção de tratamento é bem inferior em termos de eficácia. É uma forma mais segura de se oferecer a medicação mas não é isenta de risco e portanto deve ser feito apenas em ambiente hospitalar por alergistas treinados. Além disso leva a uma tolerância temporária, isto é, não é sinônimo de cura e a cada administração do medicamento a Dessensibilização deverá ser repetida.
Não é nada fácil se diagnosticar corretamente uma alergia medicamentosa em muitas situações, principalmente se o indivíduo usou vários medicamentos ao mesmo tempo É um desafio até mesmo para o Especialista e, nos últimos 10 anos, muitos estudos têm sido realizados para nos ajudar com essas investigações absolutamente individualizadas. Um trabalho árduo, “de formiguinha” mas que vale cada esforço. E ainda temos muito a aprender neste mundo da “alergia a medicamentos”.
Estudar sempre para fornecer ao paciente as respostas que ele busca em nós e , se possível, a solução ou ao menos a informação de como conviver com aquele problema da melhor e mais branda forma possível.